O livro, que tem como pretexto abrir uma coleção de clássicos voltados ao — ou pautados pelo — amor, reúne o conto que lhe dá título a outro de Joyce,
Arábias, ambos tirados da coletânea Dublinenses, e ao monólogo de Molly Bloom no capítulo final em Ulysses. Três textos curtos, que podem ser lidos, cada um, em uma única viagem, sem vertigens nem acidentes. As únicas vertigens que podem surgir aqui são as da boa literatura — que mexe, inquieta o leitor, o faz sentir e pensar.
Em Os Mortos, Joyce conta a história de Gabriel Conroy, que vai a uma festa na casa das tias
solteironas, duas velhas professoras de música que têm nele o sobrinho preferido, e, já na volta para o hotel, onde pretende pernoitar para evitar uma viagem à noite por estradas cheias de neve, tem uma revelação sobre o passado da esposa, Gretta. A maneira como Conroy reage a essa revelação é que o grande lance do conto. A cena é o ápice da história, e está apenas nas últimas páginas, mas chegar a elas não é nenhum custo. A festa na casa das tias Kate e Julia, com o seu painel dos convidados e do nacionalismo irlandês, é interessante.
Os Mortos é um conto bastante consagrado.
Mas Arábias, também pelo desfecho, pode agradar tanto ou mais. O conto troca o universo adulto pelo adolescente, acompanhando a história do garoto que se apaixona pela irmã do amigo de rua e faz de tudo para comprar um presente para ela no bazar árabe que a menina queria, mas não poderia visitar.
ilustração
David Levine,
Depois de ler esses dois livros, é só mergulhar em um trecho de Ulysses para ver que James Joyce não é nenhum bicho-papão. Em tempo: Dublinenses, a coletânea de contos que reúne Os Mortos e Arábias, foi lançada em 1914, oito anos antes de Ulisses.